Foi em um dia de chuva. Eu estava irritada porque parecia que tudo, absolutamente tudo naquele dia havia dado errado. Sai de casa, bati a porta, gritei com o homem que me pedia moedas na rua. Pisei em uma poça, gritei de novo, corri e acabei indo parar em um banco de praça.
Quando me dei conta você estava parado na minha frente. "
Assim a senhorita vai acabar se resfriando".
"
E quem se importa?"- eu com toda irritabilidade que meus dezoito anos poderiam causar, respondi.
Você sorriu, e como quem fala com uma criança, se abaixou e me perguntou: "
Você não se importa?"
Eu só queria ficar sozinha, mas você continuava parado, esperando uma resposta.
"
Não, não me importo. Por mim, poderia pegar uma gripe bem forte e morrer!"
Você olhou fundo meus olhos e eu me senti desconfortável. "
Pois eu me importo. Já vi tanta gente lutar pela vida que te ver assim, tratando-a com o maior descaso, me entristece".
Naquele momento me senti realmente como uma criança. Senti o peso dos teus olhos. Eram cinzas. Eram cor de tempestade, cor de vento, de chuva. Mas sua voz... Sua voz tinha um som tranquilo, um som de, como posso dizer? Era como um dia preguiçoso, um dia de sol em uma praia tranquila. Sinceramente não sei como eu conseguia pensar em sol no meio daquela chuva.
"
Me desculpe. É que hoje meu dia não esta dos melhores."
Você me ofereceu o guarda-chuva. Eu aceitei. Você começou a caminhar e eu fui ao teu lado. Paramos embaixo de um toldo qualquer. Eu tremia. Você tirou o casaco e o colocou sobre meus ombros. Agradeci com um sorriso tímido. Você me olhou. Mais uma vez aqueles olhos sobre mim. Era muito difícil sustentar teu olhar. Abaixei a cabeça. "
O que foi?" - Você perguntou.
"
Não sei. Você. Não sei explicar". Você sorriu. Me senti estúpida.
O que fazer? Ficamos em silêncio durante um bom espaço de tempo. Parei de tremer. Parou de chover.
"
Obrigada" - eu disse devolvendo o casaco.
"
Tudo bem".
Você passou a mão pelo o meu cabelo, se virou e foi embora.
Eu fiquei ali parada, me perguntando o que é que havia acontecido. Quem era aquele estranho com um guarda-chuva, olhos cinzentos intimidadores e voz tranquilizadora? Não sei. Até hoje não descobri.
Nunca mais nos vimos, nunca mais te vi. Mas toda vez que há uma tempestade, eu olho pelo vidro embaçado da janela e me pergunto se eu sair por aí, em agonia, correndo sem rumo sob raios e trovões, se você estará lá novamente, me esperando com um guarda-chuva.
Chego perto da janela, tento enxergar pelo vidro, e por uma fração de segundo posso jurar ver teus olhos-
cinzas como a tempestade.